Felipe Barros Laraz*
CLASSIFICAÇÃO E PROPRIEDADES
A sílica é um composto químico que possui estrutura química de um tetraedro, formado pelos átomos de silício (como átomo central) e oxigênio (em seus vértices) como apresentado na Figura 1.
Figura 1 - Estrutura química tetraédrica da sílica
Fonte: GOMES, 2018
A estrutura tetraédrica só é possível de ser formada devido a estabilidade formada em função da razão dos seus raios iônicos e da capacidade do átomo de silício de compartilhar seus quatros elétrons na última camada e assim estabilizar-se com os elétrons dos quatros oxigênios.
Essa estabilidade em função dos raios iônicos deve-se a razão dos raios obtidas, isto é, o cátion Si4+ apresenta o raio iônico 0,040 nm e ânion O2- apresenta o raio iônico 0,140 nm e pela relação rSi4+/rO2- obtemos o valor 0,285 que encontra-se na faixa, entre os números 0,225 e 0,414, e assim corresponde ao número de coordenação 4, isto é, possui quatro átomos vizinhos, como apresentado na Figura 2.
Figura 2 - Esquema molecular da sílica em função dos átomos.
Fonte: CALLISTER, 2016.
Desta maneira cada átomo de silício tem ligações com 4 átomos de oxigênio e cada átomo de oxigênio tem ligações com 2 átomos de silício, capazes formar um rede tridimensional, resultando em uma estrutura química (SiO2)n, ou simplesmente SiO2. Desse modo, é conveniente caracterizar a sílica por meio dos arranjos ao invés de células unitárias.
Os átomos quando são arranjados de maneira regular e ordenada formam uma estrutura cristalina, do contrário apresentam uma estrutura desordenada dita como estrutura amorfa, presente na matéria prima mineral conhecida como diatomita, como apresentado na Figura 3.
Figura 3 - Arranjo estrutural da sílica cristalina e da sílica amorfa
Fonte: Adaptado de CALLISTER, 2016.
As redes tridimensionais formadas pelas unidades tetraédricas da sílica podem apresentar diferentes possibilidades de arranjo estrutural, cada qual com propriedades e simetria, morfológicas e energéticas próprias. São conhecidos oito polimorfismos de SiO2 (isto é, oito diferentes estruturas cristalinas de SiO2) de ocorrência natural e, dentre elas, os mais importantes são o quartzo, a tridimita, a cristobalita, a coesita e a stishovita.
O quartzo, a tridimita e a cristobalita apresentam cada qual um polimorfo, designado convencionalmente pela letra grega β (alta temperatura) e pela letra grega α (baixa temperatura). Esses polimorfismos são devido à reorientação espacial de suas ligações químicas e dos seus arranjos tridimensionais de suas unidades tetraédricas, de modo que não envolve o rompimento de suas ligações presentes na estrutura original, sendo facilmente reversível. As transformações de fases ocorrem de maneira rápida, quase instantaneamente, em temperaturas bem definidas, que são típicas em cada caso, como apresentado na Figura 4 pelo diagrama de fases da sílica.
Figura 4 - Diagrama de fases dos polimorfos cristalinos naturais da sílica
Fonte: GOMES, 2018
Existem dois mecanismos de transformações de fases, as que ocorrem de maneira fácil sem romper as ligações químicas, mas chegam a alterar a direção e o comprimento dos arranjos tetraédricos; e as que ocorrem de maneira lenta, mas que necessitam de uma maior energia por se tratar de transformações não reversíveis, além de condições específicas de temperatura e pressão para promover, pois se trata de transformações difusionais.
Os processos de transformações de fases de quartzo, tridimita e cristobalita que acontecem de temperaturas mais baixas para temperaturas mais altas ocorrem de maneira rápida, pois ocorre apenas pequenas alterações na direção e no comprimento das ligações. Enquanto nas transformações de quartzo para tridimita e cristobalita, o processo é lento, devido à quebra de ligações existentes.
A transformação do quartzo α para β é um tipo de reação polimórfica reversível do sistema da sílica, que ocorre na faixa de 573°C. Na forma quartzo-α, com o aumento da temperatura o ângulo do sistema Si-O-Si aumenta, melhorando a sobreposição das ligações π entre Si-O. Com isso, a expansão volumétrica observada deve ser devido a mudança do ângulo Si-O-Si. Enquanto na forma quartzo-β, a expansão nula é atribuída as vibrações atômicas altamente preferidas para o espaço aberto nas estruturas, tal que provoque um aumento na distância Si-O que é compensado por uma diminuição do ângulo formado na ligação Si-O-Si.
As fases α, de baixa temperatura, são normalmente mais espaçadas que as fases β, das fases de alta temperatura. A transição de uma estrutura mais densa β para uma estrutura mais ampla α deve acontecer então superando a barreira de energia. A facilidade com que elas irão ocorrer pode variar dependendo principalmente das condições de temperatura e pressão de trabalho.
As propriedades da sílica dependem muito das condições de trabalho, isto é, temperatura e pressão. Devido as diferentes estruturas cristalinas formadas e ainda da estrutura amorfa, as propriedades podem variar desde a cor, a possuir ou não direção certa para fraturar (clivagem), dureza, densidade relativa, transparência devido a composição química ou impureza presente no composto químico formado.
No setor industrial que utilizam a areia de sílica como base em seus processos, faz-se necessário manter um certo padrão de qualidade do material, por exemplo, na fundição existe um rigoroso controle no recebimento do material referente aos parâmetros de pureza acima de 99%,é o ideal, granulometria (módulo, distribuição e percentagem de finos), forma do grão (arredondados, subangulares e angulares), integridade dos grãos, estrutura (compactos, fissurados e agrupados), a não expansibilidade, tudo isso para evitar que as peças fundidas apresentem possíveis problemas quanto a resistência aos esforços mecânicos como compressão, tração e de refratariedade.
PROCESSO DE OBTENÇÃO DA AREIA DE SÍLICA
A obtenção da areia de sílica começa na seleção das jazidas a serem exploradas, de modo que possam garantir um minério de alta qualidade; na mina a exploração é controlada e otimizada através de critérios de lavras bem definidos, isto é, depende muito da localização e forma do depósito mineral.
Após a exploração da mina, realiza-se um tratamento prévio de lavagem e classificação granulométrica da areia de sílica obtida. Posteriormente as areias de sílica são enviadas para as torres de desaguamento onde são amostrados, analisados periodicamente e disponibilizados para fornecimento a úmido. Para fornecimento a seco as areias de sílica são transportados para secadores de leito fluidizados a gás natural e em seguida são acondicionados em silos com dispositivos de anti segregação onde são disponibilizados para carregamento a seco.
Realiza-se um quarteamento e homogeneização do material, onde são coletadas pequenas porções do material que serão utilizadas para a realização do ensaio de análise granulométrica, a fim de obter a distribuição das partículas de areia de sílica, seu teor de material retido nas peneiras e seu módulo de finura (AFS). As areias de sílicas produzidas podem apresentar granulometrias nas faixas de módulos de finuras 30/40, 40/50, 50/60, 55/65, 60/70, 80/100.
Uma das técnicas mais antigas para classificar as frações das partículas com diferentes faixas de tamanho se dá pelo método de peneiramento, que consiste em avaliar a capacidade ou incapacidade dessas partículas de passar através de uma malha, isto é, uma abertura quadrada que possui tamanho dependente do número e diâmetro dos fios, sendo classificada pela quantidade de fios por uma polegada. Por sua vez, o número de malha por polegada é também conhecido por mesh, portanto uma malha de 200 mesh (malha 200), possui 200 fios dentro de uma polegada (25,4 mm = 1 polegada).
O princípio do método, de acordo com a norma CEMP 81 em vigor, consiste no peneiramento de materiais granulares por meio do conjunto de peneiras padronizadas, sobrepostas em ordem decrescente de abertura de malha, isto é, de maior abertura para menor abertura ou do menor número de mesh para o maior número de mesh.
Após a realização da técnica, obtêm-se uma classificação granulométrica do material analisado, isto é, uma classificação de acordo com a granulometria ou tamanho das partículas do material. E com isso, poderá ser realizado uma análise granulométrica, ou seja, um estudo em função da quantidade retida de uma peneira para a outra e assim determinar a sua curva de frequência acumulativa e determinar alguns fatores importantes, como por exemplo o d50, que é o tamanho de partícula que corresponde quando a porcentagem acumulada chega a 50%; a fluidez do material e o teor fino do material que passou por todas as malhas, conhecido como teor de partículas finas ou módulo de finura, que é o somatório do produto do teor de finos pelo fator multiplicativo definido pela norma para cada uma das peneiras.
Uma norma utilizada é a CEMP 81 que dependendo do seu material faz-se necessário uma lavagem, para eliminar qualquer resíduo presente, ou calcinação durante 3 a 4 horas a 950 ± 20°C para eliminar qualquer outra substância química presente. Em seguida deve-se deixar resfriar até 105° e 130°C atingir uma massa constante e depois em um dessecador deixar até temperatura ambiente. Posteriormente retira-se uma quantidade de 20 g a 50 g do material e deposita-o em um conjunto de peneiras sobrepostas em ordem decrescente.
Deve-se deixar peneirar durante o tempo médio de 12 minutos e uma intensidade de vibração de até 80% de sua capacidade e assim após esse processo, remove-se o conjunto e com cuidado retira-se a quantidade de material retido nas peneiras com auxílio de um pincel, de modo a transferir o material para um papel e assim realizar a pesagem da massa em gramas.
Desse modo deve ser coletados as informações para a construção da tabela afim de calcular a distribuição granulométrica, módulo de finura e teor de finos do material, com a série de peneiras segundo a ABNT. Um exemplo é apresentado na Figura 5, que deve ser informado o peso da peneira vazia, isto é, antes do processo; o peso da peneira mais o material retido; o peso somente do material retido que pode ser calculado pela diferença das duas informações anteriormente informadas; o teor do material retido que é o valor retido em percentagem em função do valor total do material; os fatores multiplicativos são informados e por fim o produto é o resultado da multiplicação da retenção (%) pelos fatores multiplicativos.
Figura 5 – Exemplo do esquema de planilha para avaliar a distribuição granulométrica, módulo de finura e teor de finos, com série de planilhas segundo a ABNT.
Fonte: ABIFA, 2015
No processo de fundição, de acordo com o resultado de teor de finos obtidos pela análise da distribuição granulométrica, poderá ser avaliado se a areia de sílica utilizada irá precisar ou não de uma maior quantidade de aditivos para obter uma maior estabilidade com o sistema afim de resistir as forças mecânicas de compressão e tração; pois o teor das partículas finas implicar nas propriedades de sinterização da areia de sílica e assim na diminuição de permeabilidade do molde.
APLICAÇÕES DA AREIA DE SÍLICA
Devido ao seus diferentes tipos de estrutura cristalina a sílica é o material mais utilizado como suporte para cromatografia dos materiais, por apresentar rigidez e alta estabilidade mecânica e térmica; é destaque da indústrias ópticas, devido a sua transparência e o poder de rotacionar o plano de polarização da luz, e na indústrias eletro-eletrônica, por apresentar piezoeletrocidade, que é a propriedade de um cristal desenvolver poloridade elétrica por meio da migração de cargas elétricas ao longo de uma direção.
A sílica natural, obtido a partir de depósitos comuns de areia tem diversas aplicações na construção civil e é a matéria prima essencial na fabricação de vidros e de alguma cerâmica. A sílica vítrea, obtida a partir do quartzo ou sinteticamente, são muito importantes nas aplicações das indústrias de fibras ópticas.
A areia de sílica na fundição é utilizada como material de moldagem, responsável de formar a parte externa da peça fundida, e como núcleos, que formam os espaços vazios internos de produtos como blocos de motor. Desse modo, a areia de sílica tem a função de resistir às solicitações térmicas, mecânicas e químicas a que os estão submetidos os moldes, desde o vazamento do metal fundido até a solidificação das peças produzidas.
*Felipe Barros Laraz é engenheiro de materiais pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná.
FONTES CONSULTADAS:
ABIFA. CEMP-081 Materiais granulares usados em fundição - determinação da distribuição granulométrica e módulo de finura. Comissão de Estudos de Matérias-Primas, ABIFA. Novembro, 2015.
Vlach, S. R. F. A classe dos tectossilicatos: guia geral da teoria e exercício. Geologia USP. Série Didática 2002, 1, 4.
CALLISTER, W. D., Ciência e Engenharia de Materiais: Uma Introdução. John Wiley & Sons, Inc., 2016.
GOMES, Luana da S. et al. A Sílica e suas Particularidades. 2018. Revista Virtual da Quimica.
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